domingo, 13 de março de 2011

JARBAS PASSARINHO: Reverencias ao mestre

        Recordando a figura de meu pai, que todos os dias, após a sesta diária levava horas e horas a ler os jornais do dia, para depois guardar  os recortes de matérias que lhe chamavam à atenção. Um pouco antes de falecer me deu de presente alguns recortes de jornais. Guardo comigo preciosidades de autoria de Jarbas Passarinho (de quem gostava desde minha juventude estudantil), Cléo Bernardo, Eládio Malato, dentre outros. Hoje revirando minha estante em busca do livro "O Caso dos Exploradores de Caverna", de autoria do professor de "Jurisprudence" da Harward Law Scholl, LON L. FULLER, exigência de leitura do meu Curso de Direito na ESTÁCIO-FAP, encontrei algumas relíquias. Vale a pena compartilhar a leitura desse artigo de 1997.
Ser político
Por Jarbas Passarinho - Senador


        Convidado pela Associação Pernambucana de Imprensa, fui a Assembleia Legislativa do Recife, para discutir o tema: “O Político e a Imprensa”. Rememoro parte do que disse lá.

        O poeta escreveu: “Ser mãe é padecer no paraíso”. Um prosador poderia escrever que “ser político é conviver com a incompreensão e resignar-se com a agressão coletiva”. Atacar o político é garantia de aplauso popular. A imprensa, a mesma, que se nutre fundamentalmente do fato político, que encontra nas portas do Legislativo a fonte primacial para o noticiário diário, nem sempre deixa de preparar a opinião pública para o "desconceito" do político. O pior é que, como ocorre, aliás, com os profissionais de outras categorias, o mau político produz a generalização da condenação. Se alguns vendem a consciência, logo é como se todos a vendessem é como se os homens e mulheres que não integram a classe dos políticos fossem todos absolutamente corretos, éticos e dignos.

        Conheci talentosos repórteres que, nos anos do Estado Novo, se refugiaram na crônica policial, pois os jornais, em assuntos políticos, com o Legislativo fechado, eram obrigados a publicar louvações ao ditador e só. E aí daqueles que ousassem se negar a publicá-las. Na hora em que os Parlamentos forem fechados, aos jornalistas só restará o caminho que seus antepassados trilharam na ditadura getulista, pois se os políticos são generalizadamente desonestos, a esse teorema seguir-se-ia obrigatoriamente o corolário: devem ser extintos os Legislativos.

      Presidi uma CPI, a do orçamento, mais conhecida como a dos “anões”, que levou a perda do mandato de dez dos dezoito acusados. Não tenho notícia de qualquer parlamento no mundo democrático que haja alcançado algo igual ou parecido (o destaque é meu). Na Itália, na fase das averiguações as “Mãos Limpas”, nenhum parlamentar foi punido. Apenas Andreotti, senador, teve as imunidades suspensas. A imprensa foi de tal importância para o bom êxito de nossa missão, conquanto haja, aqui e ali, fomos prejudicado pelos “furos” que acabavam favorecendo os culpados, aos quais davam tempo, quebrada a surpresa, para forjarem álibis.

        Não é só a imprensa que contribui para o mal julgamento generalizado dos políticos. Não haveria julgamento injusto se não déssemos razões ao julgador, pela nossa conduta. Winston Churchil, medularmente político, ajudava a ironizar. Um jornalista perguntou-lhe, certa feita, quais eram as qualificações necessárias a um jovem que desejasse ingressar na vida política. Ele respondeu. “É a qualidade de prever o que vai acontecer amanhã, na próxima semana, nos próximos meses e ano”. Fez uma pausa marcada pelo olhar maroto e concluiu: “E de ter a habilidade de explicar depois porque nada disso aconteceu”... Em suma: "uma qualidade de esperteza cínica".

    As pessoas em geral, já descrentes dos políticos, tornam-se por vezes mais severas, injustas, e identificáveis com os que Rui Barbosa chamava de “magarefes da honra alheia”. Ou por serem cruéis por natureza, ou porque jamais compreenderam que, como dizia Bismarch, “a política é a arte do possível e do indicado”.

    Fazendo autocrítica, reconheço que fornecemos, não raro, motivo para as censuras, quando enveredamos pelo movediço terreno do possível ainda que não o indicado. Sobretudo em questão ética. O esquecimento de uma ofensa, quando o ofensor toma a iniciativa o ofendido de ontem, o que implica uma desculpa, nem sempre é compreendido. Uns são cometidos na critica. Outros tomados de uma indignação maior do que a que podem conter enveredam pelo insulto soez. As alianças dos contrários é particularmente vulnerável quando o esquecimento é de uma ofensa contra a honra. Não há como não escapar da incompreensão ou ficar imune a peçonha de supostos amigos, muitas vezes movidos por sentimentos por seu turno nada nobres, ainda que posem de Catão, o antigo. Desgraçadamente a vida do político pode levá-lo a conduzir-se de modo a aparentar falta de coerência, porque por sua vez se deixa dominar também por sentimentos menores, como que se traduz na perversa expressão: “O inimigo de meu inimigo, meu inimigo é”. Por essas armadilhas que nossos destinos enfrentam, com certa frequência, é que estou cada vez mais inclinado a recolher a vela do meu pobre barco singrando as águas ardilosas do política.

PASSARINHO, Jarbas. Ser Político. Jornal O LIBERAL. Belém, 7 de setembro de 1997. pag. 2. Atualidades.

Revisado em 24 de dezembro de 2021.

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