A política não é um fim em si mesmo. Trata-se de um sistema-meio para administrar as necessidades do povo. Sendo assim, é uma missão, não uma profissão. Aristóteles ensina que o cidadão deve servir a polis, visando o bem comum. Ao se afastar dessa meta, dá lugar à corrupção. Que acontece quando “quem governa se desvia do objetivo de atingir o bem comum e passa a governar de acordo com seus interesses”, diz o filósofo.
Por
conseguinte, política não deve ser escada para promover pessoas, nem meio para
facilitar negócios. Como sistema, desenvolve a capacidade de responder aspirações,
transformar expectativas em programa, coordenar comportamento coletivos e
recrutar para a vida pública quem deseja cumprir uma missão social.
Esse acervo
é utópico? Pode ser, mas deve servir de inspiração aos políticos. Infelizmente em
nossa cultura a política tem sido tratada por muitos como um bom negócio.
Tradição que vem lá de trás. Quando João III, entre 15334 e 1536, criou aos
seus donatários 14 Capitanias Hereditárias, plantava a semente do
patrimonialismo, a imbricação do público com o privado.
Os
donatários recebiam a posse das terras, podiam transferi-las para os filhos,
mas não vende-la. Consideravam a capitania como uma possessão, sua propriedade.
A res pública virou coisa privada.
Hoje parcela
dos nossos representantes considera espaços públicos por seus indicados como
feudos, extensões de suas posses. É assim que a política se transforma em um
dos maiores e melhores negócios da Federação. O caminho é este: primeiro
conquista-se o mandato; a seguir a política transforma-se em instrumento de
intermediação. Temos um amplo mercado e um território com 27 Estados (com o DF),
com nichos, estrutura, cargos, e posições em três esferas: federal, estadual e
municipal.
O negócio
da política mexe com cerca de 150 milhões de consumidores que formam o
contingente eleitoral. Para chegar a eles um candidato gasta uns bons trocados (o
custo médio de estar entre 12 a 15 reais por eleitor), a depender do cargo
disputado: vereador, prefeito, deputado estadual, deputado federal, governador,
senador e Presidente da República. Para tanto, candidatos ricos bancam suas
campanhas.
A maior
parte recebe recursos do fundo partidário ou doações. Para 2020, o fundo
partidário deve ficar em torno de R$ 2,5 bilhões, sendo que o PSL e o PT, os
dois maiores partidos da Câmara, receberão as maiores fatias. O que se sabe é
que numa campanha despende-se três a quatro mais recursos do que a apresentada
aos Tribunais eleitorais. São poucos os que conseguem chegar ao Parlamento com somas
pequenas.
Desse panorama
surge a pergunta: se a campanha política no Brasil é tão dispendiosa e se os
candidatos gastam acima do que ganham, por que se empenham tanto em assumir a
espinhosa e sacrificada missão de servir ao povo? Será que há muito desvio
entre espírito cívico de servir e o sentido prático de servir?
É arriscado
inferir sobre ações e comportamento do nosso corpo político, até porque parcel
do Congresso tem atuado de maneira nobre na defesa de seus representados. Sofre,
injustamente, críticas por conta da corrupção cometida por alguns.
E onde
brota a semente da corrupção? Vejamos, nas cercanias da política há um costume
conhecido como superfaturamento. Obras públicas, nas três malhas da administração
(federal, estadual e municipal) geralmente acabam recebendo um “plus”, um
dinheiro a mais. Parcelas dos recursos servem aos achacadores e vão para os
cofres das campanhas, formando o círculo vicioso responsável pelo lamaçal. Hoje
esse lamaçal está sendo devassado pela Operação Lava Jato. Mas, há sempre uma
fresta por onde se desvia dinheiro. E isso ocorre porque nos postos chaves
estão pessoas de confiança de políticos que as indicaram.
Portanto,
há um PIB informal formado por recursos extraídos das malhas da administração nas
três instancias federativas. Sanguessugas predadoras escondem-se em parcela do
corpo político para sugar as veias do Estado brasileiro. Dinheiro e poder são
vigas da vida pública mas começam a soçobrar nesse início de ciclo da ética e
da transparência.
TORQUARTO, Gaudêncio. Política
é missão, não profissão. O Liberal. Caderno Cidades. Página 2. 21.12.2019.
Belém – Pará.
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