quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010



Essa foi pinçada do portal G1, em 11/02/2010:
Geneton Moraes Neto

UM ESTUDANTE CHAMADO ALCIDES DO NASCIMENTO LINS, UMA EX-CATADORA DE LIXO CHAMADA MARIA LUIZA – E A ENORME, A INDESCRITÍVEL, A MONSTRUOSA VERGONHA DE SER BRASILEIRO

O estudante Alcides: vergonha, vergonha, vergonha

A TV é imbatível na arte de produzir lembranças marcantes. Uma imagem aparentemente banal pode ficar anos gravada nas nossos retinas fatigadas. Um exemplo: a alegria sinceríssima de uma ex-catadora de lixo chamada Maria Luiza ao receber a notícia de que o filho tinha sido aprovado no vestibular de Biomedicina da Universidade Federal de Pernambuco.
Detalhe: criado com as dificuldades imagináveis, o filho tinha tirado o primeiro lugar entre os alunos de escolas públicas aprovados no vestibular. A imagem da vibração da mãe tinha sido captada quase que casualmente pelo cinegrafista Marconi Pryston, durante a gravação de uma reportagem sobre o vestibular para o telejornal local da TV Globo Recife. A alegria da mãe ganhou repercussão nacional ao ser exibida no Fantástico, numa série conduzida por Zeca Camargo. Era comovente. O tema da reportagem era a felicidade. Em seguida, o exemplo do estudante ganhou espaço no Globo Repórter.
O filho de D. Maria Luiza iria se formar este ano. Mas foi assassinado a tiros, na porta de casa, no bairro da Torre, no Recife. Os dois assassinos procuravam por outro homem. Não o encontraram. Abordaram Alcides – que morava numa casa vizinha -, em busca de notícias. Como Alcides disse que não sabia onde estava o “alvo”, foi morto com dois tiros na cabeça, à queima-roupa. Execução sumária. Não há outra palavra para definir os autores do crime: são animais. Ponto.
Faltará alguém na festa de formatura da turma de biomedicina da Universdiade Federal de Pernambuco. A ex-catadora de lixo disse às tvs: “Minha vida acabou”.
O Brasil tem uma dívida enorme, indescritível, imensurável com Alcides do Nascimento Lins e com esta mulher. A dívida com Alcides jamais poderá ser paga. Uma vida foi desperdiçada em troca de quê ? De nada. Há qualquer coisa de terrivelmente errado num país que premia com dois balaços o filho de uma ex-catadora de lixo que, a despeito de tudo, chega à universidade na condição de primeiro lugar entre alunos de escola pública. Tinha vinte e dois anos de idade. Vinte e dois!
Neste momento, só há um sentimento possível : a enorme, a indescritível, a imensurável, a monstruosa vergonha de ser brasileiro.

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