sábado, 23 de outubro de 2010

O VOTO AVOADO


AS RAZÕES DO VOTO AVOADO
Por Roberto Pompeu de Toledo

O nobre parlamentar Tiririca vai desculpar o aparte, mas pior do que está fica. Um Congresso é sempre pior do que o anterior, ensinava um antecessor de Tiririca na Câmara dos Deputados, chamado Ulysses Guimarães. Uma das razões para a piora gradual e segura da representação parlamentar é o modo avoado com que o eleitor deposita na urna o voto para deputado. E uma das razões para o modo avoado de votar é a coincidência das eleições parlamentares com as eleições para os cargos executivos. A eleição presidencial absorve a maior parte da atenção do eleitor. A de governador vem em segundo lugar. A de senador em terceiro. Lá na rabeira, no cantinho do cérebro, vem a de deputado.
Duas objeções costumam ser levantadas contra o descolamento da eleição parlamentar da executiva. Primeira: isso provocaria uma descoincidência dos períodos de mandato dos parlamentares e do poder executivo. Segunda: duplicaria o custo de produzir uma eleição. Quanto à primeira questão uma dúvida: será que isso é ruim? Quanto à segunda, uma certeza: e quanto custam para o país Congressos dos que nos tem cabido?
Mesmo se a eleição para deputado fosse isolada sobraria outra razão para o voto avoado: a impossibilidade do eleitor conhecer os candidatos, sua biografia e seu s projetos. Em São Paulo um total de 1276 candidatos apresentou-se à eleição para a Câmara dos Deputados. Para a Assembléia Legislativa, apresentaram-se 1976. É uma pena multidão, a disputar um naco de reconhecimento do eleitorado, seja na televisão, seja na internet, seja a pé, nas ruas. Como compará-los? Como nesse bolo sem cara nem forma, pinçar um?
A impossível escolha de um nome, entre um número desarrazoado de pretendentes decorre do sistema em vigor no Brasil, para a eleição de deputado: a eleição proporcional “uninominal”. Só quatro países, além do Brasil, o adotam: Finlândia, Peru, Chile e Polônia. A maioria dos países que empregam o sistema proporcional – aquele em que a representação que se faz de acordo com a proporção dos votos dos diferentes partidos – prefere a modalidade de “lista fechada”, quer dizer: os partidos elaboram uma lista de candidatos e a apresentam já pronta ao eleitor. Em conseqüência, não se vota em candidato; vota-se no partido. A multidão de pretendentes individuais dá lugar a um duelo entre siglas. Fica mais viável fazer a campanha.
No sistema brasileiro, vota-se num candidato com nome, sobrenome (ou apelido, como Tiririca) e até retrato na urna eletrônica. O eleitor pensa, com razão, que está votando naquele nome, naquele retrato, mas pode ser que não esteja. Quem em São Paulo votou em Tiririca elegeu os deputados Protógenes de Queiróz (PCdoB), Vanderlei Siraque (PT) e Otoniel Lima (PRB). Isso ocorre porque as “sobras” de um candidato, isto é os votos que ultrapassam o número mínimo para um partido eleger cada representante (o tal “quociente eleitoral”), são transferidos para a cesta de seu partido ou sua coligação. Como Tiririca, com seu mais de 1,3 milhão de votos, superou em três vezes o quociente eleitoral de 300.000 votos, contribuiu para eleger três candidatos da coligação que não haviam atingido. Só um eleitor muito bem informado entende o sistema. Há alternativas ao sistema brasileiro. As mais citadas são a lista fechada e o voto distrital. No distrital o país é dividido em distritos pequenos, em número igual ao de cadeiras na Câmara, e, em cada um deles, elege um candidato. A eleição deixa de ser proporcional. É majoritária, como a de um presidente a do governador. Quem tem mais voto está eleito. Não há sistema perfeito. Todos tem seus pontos fracos. O que está claro, depois destes anos todos, é que o adotado no Brasil é o mais imperfeito. E por que não se muda, se se sabe disso há muito tempo, e já há tempo que se discute o assunto? Ora, caro (e) leitor. Porque a idéia é essa mesma. Fazer com que seu voto seja avoado.
DE TOLEDO, Roberto Pompeu. Revista VEJA. Edição 2187. ano 43. nº42. página 190. 20.10.2010. Editora ABRIL. São Paulo - SP. 

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