Em nome da obsessão
fiscal, o surgimento de novos municípios está e continua congelado há 17 anos.
Ministério da Fazenda orientou veto à proposta.
Antonio
Lassance
A Presidência da República vetou, e com uma
justificativa bastante "econômica" - em todos os sentidos -, todo o
projeto de lei que regulamentaria a criação, a incorporação, a fusão e o
desmembramento de municípios no Brasil.
Em nome da obsessão fiscal, o surgimento de novos
municípios está e continua congelado há 17 anos. O interessante é que o mantra
fiscalista, por um lado, é extremamente zeloso com relação à elevação de gastos
sociais e de custeio da máquina administrativa, mas tem menos parcimônia quando
o assunto é pagamento de juros, refinanciamento de dívidas a empresas
multinacionais, cobrança de impostos sobre jatinhos e helicópteros e taxação
sobre transações financeiras internacionais.
A mensagem de veto diz que, ouvido o Ministério da
Fazenda, este manifestou-se contrariamente porque o projeto permitiria “a
expansão expressiva" [sic] "do número de municípios no País,
resultando em aumento de despesas com a manutenção de sua estrutura
administrativa e representativa. Além disso, esse crescimento de despesas não
será acompanhado por receitas equivalentes, o que impactará negativamente a
sustentabilidade fiscal e a estabilidade macroeconômica. Por fim, haverá maior
pulverização na repartição dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios
(FPM), o que prejudicará principalmente os municípios menores e com maiores
dificuldades financeiras.”
A tal "expansão expressiva" seria, no
máximo, de 5% de novos municípios. Considerando que faz duas décadas que o
Brasil praticamente não cria municípios, alguém precisa informar ao nosso ministro
desenvolvimentista da Fazenda que o país mudou, e bastante, em termos
demográficos e socioeconômicos, em todas as regiões do País.
O que o Brasil transfere aos municípios anualmente é bem menos do que faz com o pagamento de dívida ao mercado financeiro. A transferência obrigatória a Estados e Municípios não chega a 9,5% do orçamento, bem menos do que os 34,5% gastos com amortização da dívida. Seja com 200 ou 300 municípios a mais (se muito), o FPM continuará o mesmo, pois ele não cresce conforme o número de municípios, e sim de acordo com a arrecadação de impostos. Na realidade, cada município teria que gastar menos com despesas administrativas e de custeio, pelos próprios limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
O que o Brasil transfere aos municípios anualmente é bem menos do que faz com o pagamento de dívida ao mercado financeiro. A transferência obrigatória a Estados e Municípios não chega a 9,5% do orçamento, bem menos do que os 34,5% gastos com amortização da dívida. Seja com 200 ou 300 municípios a mais (se muito), o FPM continuará o mesmo, pois ele não cresce conforme o número de municípios, e sim de acordo com a arrecadação de impostos. Na realidade, cada município teria que gastar menos com despesas administrativas e de custeio, pelos próprios limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Detalhe: o projeto não manda criar município.
Apenas diz quais são as regras para fazê-lo, entre elas, uma essencial: a de
que os municípios novos precisam ter um número mínimo de habitantes. Antes, na
ausência de requisitos desse tipo, o Brasil já criou municípios de 800 habitantes.
Se tais critérios existissem anteriormente, teríamos uns mil municípios a
menos.
No Congresso, a proposta foi amplamente apoiada por
todos os partidos, dos governistas aos oposicionistas. Na Câmara dos Deputados
e no Senado, os votos favoráveis seriam suficientes até para aprovar uma emenda
constitucional sobre o assunto. Em 30 dias, o Congresso vai apreciar e,
provavelmente, derrubar o veto.
Apesar do desgaste político, o que pesou mesmo no
veto foi o discurso feito sob medida para agradar a Ebenezer Scrooge, o
personagem avarento do conto de Natal de Charles Dickens e que bem personifica
as vozes que ouvimos, rotineiramente, do "espírito" do mercado. Isso
é muito importante. Afinal, o Natal está chegando e, nessa época, os nervos do
Sr. Scrooge ficam à flor da pele. Ele não entende patavina de federalismo e
torce o nariz para políticas sociais.
O Sr. Scrooge ainda não leu o Diário Oficial de
hoje porque está deveras ocupado saboreando o Financial Times e a The Economist
desta semana. De todo modo, quando alguém lhe der a notícia, resmungará que o
governo não fez mais que sua obrigação: a de dizer "não". Afinal, é
para isso que serve o Estado.
Em época de "terrorismo fiscal", como se
fala pelos corredores de Brasília, a Fazenda se intimidou e teve uma recaída em
sua Síndrome de Estocolmo. Mais uma para a coleção.
(*) Antonio Lassance é Doutor em Ciência Política
pela Universidade de Brasília.
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Para-ingles-ver-o-veto-a-proposta-de-criacao-de-novos-municipios/4/29550,
acesso 18.11.2013, às
18:13 horas.
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