segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Perda de mandato é resposta à marginalização dos agentes públicos



Por Alexandre Camanho

O julgamento do mensalão emancipou-se – em diversos aspectos – da jurisprudência indulgente com agentes públicos corruptos. Reconciliou a leitura da Constituição com a República.

Ora, juntamente com outros instrumentos recentes – como a Lei da Ficha Limpa – , o devido rigor que o Supremo dispensou aos crimes praticados pelos mensaleiros arejou um sistema político eleitoral até então desgastado e descompassado dos reclamos sociais, notadamente os relacionados ao desenvolvimento do país e ao combate à corrupção que o degenera.

O povo elege seus representantes e não pode se ver refém de uma confiança traída: é preciso que haja efetiva resposta à crescente “marginalização” dos agentes públicos.
Nesse rumo, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento definitivo de que a perda do mandato de parlamentar condenado por crime contra a administração pública, no foro privilegiado do Supremo, não depende de decisão do Plenário da Casa do Congresso em que o parlamentar exerça o mandato popular. É dizer: a perda do mandato é consequência automática da suspensão dos direitos políticos por condenação criminal transitada em julgado.

A discussão orbitava os artigos 15-III (“É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: III – condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos”) e 55-IV (“Perderá o mandato o Deputado ou Senador: IV – que perder ou tiver suspensos os direitos políticos”) da Constituição.
Ora, se é certo que a Constituição permite-se licitamente interpretar por qualquer cidadão, instância pública ou segmento privado, não menos certo é que ao Supremo cabe de forma vinculante ditar exegese sobre matéria constitucional, cabendo à Câmara ou ao Senado um “provimento meramente declaratório” para cassar o mandato do parlamentar condenado por crime contra a administração pública, uma vez que a condenação criminal por si opera a restrição dos direitos políticos.

Não há que se falar, portanto, em afronta ao postulado da Separação dos Poderes, mas sim em cumprimento do quanto estabelece a Constituição em matéria de ética e moralidade política, segundo a inquestionável deliberação do Supremo.

Como ponderou o ministro Gilmar Mendes, “do ponto de vista lógico, eu sequer consigo entender que nós aceitemos como válida a aplicação da Lei de Improbidade e da Lei da Ficha Limpa, que reforça a ideia da inelegibilidade, e consideremos hígido o mandato de um deputado preso com trânsito em julgado no exercício do mandato”.
O condenado por crime contra a administração pública perde seu direito de ser visto como representante do povo, justamente porque inverteu a supremacia dos interesses que deveria defender – o privado preponderou ao público.

* Alexandre Camanho é Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, ANPR. Há vinte anos no Ministério Público Federal, trabalhou na força tarefa do caso PC-Collor e compôs o grupo de trabalho do órgão para combate à lavagem de dinheiro.

Nenhum comentário:

Postar um comentário